Legumes, hortaliças e frutas produzidos sem insumos sintéticos são mais caros, mas preços por embalagem podem dar ilusão de estarem mais próximos dos itens convencionais. Também é preciso verificar os selos de certificação.
A inflação em janeiro foi marcada por uma alta nos preços de alimentos. No IPCA de 0,42% do mês passado, o grupo alimentação teve alta de 1,38%, a maior para o mês desde 2016. O Índice de Preços ao Consumidor Mercado (IPC-M) apontou alta de 12,41% para hortaliças e legumes e de 7,21% para frutas.
Nessa hora, muitos consumidores têm que encarar uma verdadeira missão impossível na hora de buscar bons preços nas feiras e supermercados. Foi então que muita gente começou a ver alimentos orgânicos, tradicionalmente mais caros, como alternativa vantajosa. Mas nem sempre isso é verdade, alertam especialistas em direito do consumidor.
O diretor do Instituto de Agronomia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Everaldo Zonta, diz que alimentos orgânicos são cerca de 30% mais caros na feira. Esse percentual pode chegar a 100% — ou seja, custar o dobro do item convencional — no supermercado, segundo ele. Isso está ligado à forma distinta de produção. O problema é a forma como os orgânicos são apresentados, dificultando a comparação.
Em um supermercado visitado pelo GLOBO no Rio na semana passada, a cenoura convencional era vendida por R$ 9,79 o quilo enquanto a orgânica custava R$ 10,99. O preço parece muito próximo e pode estimular a compra da produzida sem agentes químicos. Mas há uma diferença sutil: a orgânica não é vendida por quilo, mas num pacote que tem 570g do legume. O quilo da cenoura orgânica neste exemplo era R$ 19,28, quase o dobro da comum.
Em outro estabelecimento a diferença era em proporção similar no caso da cebola. A orgânica custava R$ 12,69 o quilo, e a convencional, R$ 6,99. Num terceiro, a beterraba orgânica saía por R$ 12,99 o quilo e a convencional, R$ 10,39, uma distância menor.
Segundo a Lei n° 14.181 do Código de Defesa do Consumidor, os preços dos produtos devem ser indicados por unidade de medida, como quilo e litro. O professor de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Gustavo Kloh, explica que, para o esclarecimento do consumidor, o preço deve ser especificado em uma única medida, como o quilo para grandes quantidades.
— O ideal para o esclarecimento do consumidor é especificar o preço por quilo. O preço do produto por quilo deve ser apresentado em uma letra legível e de bom tamanho, facilitando a identificação pelo consumidor. Existem diversos aspectos que podem confundir o consumidor na hora da compra, e este é um deles.
Ao se deparar com diferenças na unidade de medida e preço, Kloh diz que o consumidor pode buscar canais de denúncia como os Procons.
Como identificar
Outro desafio nesse tipo de compra é ter certeza de que o produto mais caro é mesmo orgânico. De acordo com a legislação brasileira, um produto é considerado orgânico quando é obtido em um sistema de produção agropecuária orgânica ou de processo extrativista sustentável e não prejudicial ao ecossistema local.
José Antônio Espíndola, presidente do comitê gestor do portfólio da Embrapa sobre agroecologia e produção orgânica, explica que a agricultura orgânica surgiu como uma alternativa à convencional, que utiliza insumos sintéticos.
— Na agricultura orgânica, o agricultor deve seguir um conjunto de regras associadas à preservação de produtos naturais e evitar o uso de alguns produtos sintéticos — explica.
Para serem comercializados como orgânicos, os alimentos devem ser certificados por organismos credenciados no Ministério da Agricultura, sendo dispensados da certificação somente aqueles produzidos por agricultores familiares que fazem parte de organizações de controle social cadastradas no ministério, que comercializam exclusivamente em venda direta aos consumidores. Segundo a pasta, atualmente há 24.824 produtores certificados para produzirem alimentos orgânicos.
Zonta, da UFRRJ, recomenda que os consumidores fiquem atentos para só comprar produtos com certificados nas embalagens:
— Nos supermercados, compre o produto devidamente certificado e com o selo Brasil Orgânico, pois não é possível fazer uma análise por conta própria. Nas feiras de orgânicos, também só são vendidos produtos certificados.
Custo mais alto tem motivo
O preço mais elevado, segundo ele, se justifica pela forma como são produzidos, com maior emprego de mão de obra e menos maquinário, insumos mais caros e uma série de regras impostas pela certificação à produção orgânica.
— Há fertilizantes que custam o dobro do preço dos tradicionais. Além disso, para ter uma propriedade orgânica, é necessário desembolsar anualmente dinheiro para certificações. É o único tipo de agricultura que tem uma legislação específica a ser seguida — diz Zonta.