Entre 20% e 30% das compras on-line são feitas usando o cartão de crédito de terceiros, aponta levantamento feito pela Unico, empresa especializada em identidade digital. O hábito dos brasileiros de emprestar o cartão para parentes e amigos, ou de usar meio de pagamento de titularidade diferente daquela da assinatura do streaming ou da conta na plataforma de vendas, no entanto, está na mira das empresas que querem minimizar o risco de fraude.

O estudo da Unico, feito a partir de dados da Associação Brasileira de Cartões (Abecs), aponta ainda que a dificuldade em comprovar a identificação do comprador em transações on-line afeta mais de 150 milhões de brasileiros por ano e pode deixar de gerar R$ 120 bilhões em vendas se as compras com cartões de terceiros passarem a ser recusadas.

— O brasileiro tem essa cultura de emprestar cartão. É um problema, porque é difícil determinar se o cartão está sendo usado com consentimento ou se é uma fraude, por isso a importância das camadas de segurança — explica Gabriel Pirajá, Head de Produtos da Unico.

No comércio tradicional, o percentual das compras com meios de pagamento de terceiros também é significativo. Pesquisa feita pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), em parceria com o Sebrae, mostra que 32% dos consumidores fizeram compras com cheque, cartão de crédito, crediário, empréstimo ou financiamento usando o nome de outra pessoa nos 12 meses anteriores ao levantamento. Desse total, 24% usaram cartão de crédito.

Autenticação digital

Para Linconl Rocha, presidente da Associação de Meios de Pagamentos Eletrônicos (Pagos), o compartilhamento consentido do cartão de crédito é algo peculiar e estruturado na cultura de consumo brasileira:

— Os varejistas se adaptaram a isso para não perder as vendas. Hoje centenas de ferramentas e políticas de prevenção a fraude buscam distinguir o verdadeiro consumo para evitar os prejuízos causados pelo uso indevido dos cartões. A tendência é que a cada dia se use mais tecnologias como biometria da face e até voz para identificar os usuários.

As plataformas já ampliaram cruzamentos de informações na hora da compra, o que pode levar a um aumento na recusa das transações sob alegação uso indevido de um cartão de crédito.

— Algumas lojas virtuais solicitam as informações de cadastro e verificam se o endereço de destino da compra é o mesmo da fatura do cartão, além de outros cruzamentos ligados ao perfil de utilização do titular do cartão — explica o vice-presidente da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm), Rodrigo Bandeira.

Não há ilegalidade em usar o cartão de outra pessoa, desde que autorizado por ela, claro. Os bancos, no entanto, orientam que os titulares não emprestem seus cartões a terceiros, principalmente, por segurança. A Abecs ressalta ainda que o contrato do cartão estabelece que ele é intransferível e diz que, em caso de dúvida, o cliente deve ligar para a administradora.

A advogada Lilian Ferreira, de 41 anos, tem o costume de emprestar o cartão de crédito para familiares:

— Meu critério é a confiança. Já emprestei para uma amiga e não deu certo. Agora empresto só para parentes: mãe, pai, irmã, marido, e ainda não tive problemas.

Para reduzir a prática, algumas instituições financeiras têm facilitado a inclusão de filhos e outros parentes como dependentes dos cartões principais.

Na Caixa, por exemplo, o cliente pode solicitar até cinco cartões adicionais no aplicativo e estabelecer limites de gastos para cada um deles. Segundo Eduardo Cotta, superintendente de Produtos do Inter, o banco oferece também cartão adicional que permite que o cliente tenha controle sobre os gastos de terceiros.

Virtual pode não ser aceito

Outros bancos, por questões de segurança e para evitar fraudes, têm estimulado os clientes a aderirem aos cartões virtuais, sejam os temporários, usados em apenas uma transação ou que com prazo determinado, ou o permanente. Segundo especialistas, essa seria mais uma forma de proteção ao consumidor. Até porque, em algumas instituições, o cartão virtual só pode ser gerado pelo titular.

— Além disso, ao usar o cartão físico deixa-se o registro dos dados nas compras on-line e se fica mais suscetível a fraude em caso de vazamento — diz Ione Amorim, do programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).

No entanto, nem todas as lojas on-line aceitam os cartões virtuais como pagamento. Para Matheus Rodrigues, analista do Sebrae Rio, uma das razões para alguns negócios não aceitarem cartões virtuais pode ser o custo para implementação de tecnologia:

— O cartão virtual reduz os riscos de fraude. Mas alguns negócios acabam não aceitando, por custo para adesão ou limitação da empresa que presta serviço.

Confira o que dizem os bancos

Caixa: O banco oferece até cinco cartões adicionais ao titular. Para compras seguras em sites, lojas de aplicativos e serviços de assinaturas mensais, a Caixa disponibiliza o cartão de crédito virtual gratuitamente aos titulares.

Itaú: Embora o empréstimo do cartão de crédito a terceiros possa ocorrer, o banco ressalta que é “crucial que o titular compreenda os riscos associados e tome medidas para minimizá-los” . O Itaú reforça que “não há por parte do banco, entretanto, um bloqueio desse tipo de transação.”

Nubank: O banco reforça que os cartões são pessoais e intransferíveis, e a responsabilidade da guarda é exclusiva do titular. A instituição alerta sobre o risco de compras feitas por terceiros, uma vez que o CPF do titular está em risco em caso de não pagamento da fatura. E lembra ainda que há a possibilidade de comprometimento do limite em função de transações não programadas.

Santander: O contrato estabelece que o cliente, como titular do cartão de crédito, é o único responsável pelo seu uso, guarda e pagamento, bem como por todos os cartões adicionais solicitados, diz o banco. Cabe ao cliente também orientar os portadores dos cartões adicionais sobre aspectos de segurança.

Inter: O banco defende que o cliente deve ter liberdade sobre sua conta e gastos, mas sem esquecer da segurança. O ideal, diz, é que cada cartão seja de uso pessoal e intransferível, para evitar problemas de segurança e descontrole financeiro. Para aqueles que desejam compartilhar o crédito, o banco lembra que há a opção do cartão de crédito adicional.

Fonte: https://oglobo.globo.com/economia/defesa-do-consumidor/noticia/2023/09/03/por-temor-de-fraude-bancos-apertam-o-cerco-a-uso-de-cartao-de-credito-por-terceiros.ghtml